domingo, 13 de abril de 2014

Respeito e valorização do idoso



GRANDO, Cristiane. “Respeito e valorização do idoso”. Fique em Evidência. Ed. 45, Ano 3. Cerquilho, abril de 2014, p.30.
Respeito e valorização do idoso

Texto: Cristiane Grando. Escritora e tradutora. Doutora em Letras (USP), com pós-doutorado em Tradução Literária (Unicamp).

Segundo Aluízio Falcão, “Rembrandt passava dos 60 quando pintou seus quadros mais importantes. As obras de Bach ao envelhecer foram classificadas entre as mais belas e Beethoven superou a si mesmo nos derradeiros quartetos.” (O Estado de S. Paulo, 2006)

Por que decaiu a arte de contar histórias? Talvez porque tenha decaído a arte de trocar experiências” - afirma Ecléa Bosi. Eu diria que tem decaído também a arte de saber ouvir. Basta observar o ambiente escolar, com estudantes pouco interessados, o ambiente doméstico, onde a maioria das pessoas vive hipnotizada em programas televisivos, jogos eletrônicos ou Internet, e os ambientes públicos, onde crianças e adultos não desviam o olhar dos seus celulares. Em outras palavras, vivemos num mundo de solidões. Na contramão, o saber ouvir o idoso tem sido cada dia mais valorizado na sociedade brasileira. Prova disso é o processo de envelhecimento, o respeito e a valorização do idoso como tema transversal das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, publicadas pelo Ministério da Educação em 2012.

Na década de 1980, uma pessoa de 50 anos ou até menos se considerava velha, o que se notava em sua forma de se vestir e se comportar. Naquela época, a palavra velho(a) não carregava conotação negativa: assumiam a velhice como algo natural. As fotos dessa década mostram pessoas com aspecto de velhas relativamente cedo. Atualmente muitos não abandonam o trabalho nem mesmo depois de aposentados e buscam estar atualizados, em especial na área tecnológica, independente da idade. Hoje o termo velho(a) assumiu conotação depreciativa: preferimos falar idoso(a), 3a idade, maturidade ou inclusive eliminar termos que marquem a passagem do tempo, afinal, a medicina (cirurgia plástica, medicamentos e complementos alimentares), a alimentação (quando equilibrada), o modo de se vestir, as atividades esportivas e das academias nos favorecem: não demonstramos a idade que temos.

Mais importante que os termos é a postura de respeito que se toma diante do outro, seja criança, mulher ou velho, “três instâncias privilegiadas das crueldades” no mundo ocidental segundo João Alexandre Barbosa no “Prefácio” do livro Memória e sociedade: lembranças de velhos de Ecléa Bosi. Igualmente, posturas de respeito às minorias e marginalizados têm sido cada dia mais valorizadas por programas governamentais no Brasil, o que, a médio e longo prazo, esperamos ver refletidas em nosso cotidiano.

No caso dos idosos, o respeito por suas experiências, maturidade e sabedoria é algo que se pode cultivar ao saber ouvi-los, pois eles têm algo a nos ensinar: a história de um país, cidade ou bairro. De acordo com Marcos Piason Natali no livro “A política da nostalgia”, no século XIX, “a memória já era vista como parte essencial de uma vida saudável e já era considerada necessária para a construção de identidades individuais e coletivas.” Saudável também é cultivar bons relacionamentos entre as gerações e ter consciência do saldo positivo dessa atitude na educação familiar e escolar: valorizar os conhecimentos transmitidos pela oralidade, pela memória individual e coletiva que resgata valores culturais e históricos, carregada de sentimentos e vivências de quem foi protagonista de uma época. Afirma Ecléa Bosi: “Um mundo social que possui uma riqueza e uma diversidade que não conhecemos pode chegar-nos pela memória dos velhos.”

Recomendações de leitura: Lei nº 10.741/2003, que dispõe sobre o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 anos; Memória e sociedade: lembranças de velhos de Ecléa Bosi; O tempo da memória de Norberto Bobbio; A velhice de Simone de Beauvoir.