GRANDO,
Cristiane. “Respeito
e valorização do idoso”.
Fique em Evidência.
Ed. 45, Ano 3. Cerquilho, abril
de 2014,
p.30.
Respeito
e valorização do idoso
Texto:
Cristiane Grando.
Escritora
e tradutora. Doutora em Letras (USP), com pós-doutorado em Tradução
Literária (Unicamp).
Segundo
Aluízio Falcão, “Rembrandt passava dos 60 quando pintou seus
quadros mais importantes. As obras de Bach ao envelhecer foram
classificadas entre as mais belas e Beethoven superou a si mesmo nos
derradeiros quartetos.” (O
Estado de S. Paulo,
2006)
“Por
que decaiu a arte de contar histórias? Talvez porque tenha decaído
a arte de trocar experiências” - afirma Ecléa Bosi. Eu diria que
tem decaído também a arte de saber
ouvir.
Basta observar o ambiente escolar, com estudantes pouco interessados,
o ambiente doméstico, onde a maioria das pessoas vive hipnotizada em
programas televisivos, jogos eletrônicos ou Internet, e os ambientes
públicos, onde crianças e adultos não desviam o olhar dos seus
celulares. Em outras palavras, vivemos num mundo de solidões. Na
contramão, o saber
ouvir
o idoso tem sido cada dia mais valorizado na sociedade brasileira.
Prova disso é o
processo de envelhecimento, o
respeito
e a valorização do idoso como
tema transversal das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Médio, publicadas pelo Ministério da Educação em 2012.
Na
década de 1980, uma pessoa de 50 anos ou até menos se considerava
velha, o que se notava em sua forma de se vestir e se comportar.
Naquela época, a palavra velho(a)
não carregava conotação negativa: assumiam a velhice como algo
natural. As fotos dessa década mostram pessoas com aspecto de velhas
relativamente cedo. Atualmente muitos não abandonam o trabalho nem
mesmo depois de aposentados e buscam estar atualizados, em especial
na área tecnológica, independente da idade. Hoje o termo velho(a)
assumiu conotação depreciativa: preferimos falar idoso(a),
3a
idade,
maturidade
ou
inclusive eliminar termos que marquem a passagem do tempo, afinal, a
medicina (cirurgia plástica, medicamentos e complementos
alimentares), a alimentação (quando equilibrada), o modo de se
vestir, as atividades esportivas e das academias nos favorecem: não
demonstramos a idade que temos.
Mais
importante que os termos é a postura de respeito que se toma diante
do outro, seja criança, mulher ou velho, “três instâncias
privilegiadas das crueldades” no mundo ocidental segundo João
Alexandre Barbosa no “Prefácio” do livro Memória
e sociedade: lembranças de velhos de
Ecléa Bosi. Igualmente, posturas de respeito às minorias e
marginalizados têm sido cada dia mais valorizadas por programas
governamentais no Brasil, o que, a médio e longo prazo, esperamos
ver refletidas em nosso cotidiano.
No caso dos idosos,
o respeito por suas experiências, maturidade e sabedoria é algo que
se pode cultivar ao saber ouvi-los, pois eles têm algo a nos
ensinar: a história de um país, cidade ou bairro. De acordo com
Marcos Piason Natali no livro “A política da nostalgia”, no
século XIX, “a memória já era vista como parte essencial de uma
vida saudável e já era considerada necessária para a construção
de identidades individuais e coletivas.” Saudável também é
cultivar bons relacionamentos entre as gerações e ter consciência
do saldo positivo dessa atitude na educação familiar e escolar:
valorizar os conhecimentos transmitidos pela oralidade, pela memória
individual e coletiva que resgata valores culturais e históricos,
carregada de sentimentos e vivências de quem foi protagonista de uma
época. Afirma Ecléa Bosi: “Um mundo social que possui uma riqueza
e uma diversidade que não conhecemos pode chegar-nos pela memória
dos velhos.”
Recomendações
de leitura:
Lei
nº 10.741/2003,
que dispõe sobre o
Estatuto do Idoso,
destinado
a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou
superior a 60 anos;
Memória
e sociedade: lembranças de velhos de
Ecléa Bosi; O
tempo da memória de
Norberto Bobbio; A
velhice
de Simone de Beauvoir.